sexta-feira, junho 04, 2010

XI

Ele sabia que a pior coisa era não estar certo sobre o que havia verdadeiramente cometido. Encarcerado, alguma ação deveria justificar aquele estado imposto de privação e meditação profunda e contínua. O processo de compreensão passa por analisar friamente as recordações e montar o filme que vai mudando conforme a não-convergência das coisas a sentido algum. Nesse momento, as peças faltantes são fabricadas e o efeito pode ser catastrófico.

Não era o caso. Sequer lembrança havia. Mas ainda sentia a culpa. Que arranhava o estômago, dor lancinante, subia a pressão nos olhos, distorcendo as cores e borrando a penumbra que havia no recinto. Tudo parecia mais suave, com detalhes de cristais, efeito da enxaqueca que a restrição de cafeína o fazia passar - ou isso era desculpa. Mesmo de olhos fechados, tudo era claro demais. E havia aquele sol, e os sons metálicos, de bem longe.

Se pudesse desejar algo, era conhecer a extensão dos efeitos de suas ações e saber, de uma vez por todas, o que havia cometido. Desculpas, perdões e mesmo o que já fora sofrido em tal período, seria moeda de troca para amenizar a reza sem destino claro.

E pensava:
"O que poderia ter acontecido de tão ruim que não pode ser dito?"


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