segunda-feira, maio 31, 2010

Sem razão nem sentido

Existirá algo além da certeza de que há esse desperdício de energia? Algo que leve a mente a concluir algo belo sobre as impossíveis relações entre as pessoas?

Condicional ou não, o convívio parece sempre forçado. Se houver algum tipo de bem-estar, é sabido que durará pouco, uma vez que qualquer equilíbrio finda rapidamente. Tudo cansa, afinal. No fim do dia, quando as luzes se apagam e se recorda sobre os silêncios subsequentes a inúmeras tentativas de... ouvir. Quando a própria voz não é suficiente para esclarecer e responder às próprias perguntas, se fosse possível corrigir as palavras...

No começo da tarde, impossível não ter visto. Estava ali, ao lado. Ainda que não conseguisse enxergar à distância, deveria ter reconhecido a silhueta característica. Devia. Mas, agora, não é necessário perguntar. Talvez um outro dia, no qual seja possível não ser consumido por inúmeras ideias pouco publicáveis e, verdadeiramente, ansiando desculpar por qualquer motivo. Mesmo sem razão. Ainda que não haja sentido.


segunda-feira, maio 24, 2010

Desordem

Fato importante foi a forma de obter tal controle. Ao menos parte. Dividia o belo penteado em duas partes, fio por fio: a parte próxima da raiz deveria se comportar, preso com dispositivos quase invisíveis, enquanto que o restante deveria ser meticulosamente desordenado, de maneira aleatória e randômica. Em formas de semicurvas levemente onduladas, tocadas e esculpidas por brisas e tempo.

O efeito era fantástico, sabe se lá o tempo necessário para atingir o resultado, mas ao observador mais desavisado, tal cabelo era simplesmente bagunçado e fazia parte de um estilo descontraído, descuidado, casual.


quinta-feira, maio 20, 2010

Sobre Rodopios e Rugas

Dos ébrios rapazes ou senhores que por aquela praça andavam, em círculos, pouco restou. Quando, se vistos, em giros estonteantes, como cinegrafistas a representar pessoas felizes, brincalhonas, em propaganda de fragrâncias, carregavam a pura e simples alegria de não se preocupar com o antes, nem o depois, certamente, nem o agora.

"Agora" não deveria existir. Exigentes a confrontar o estado dos tempos, os burocráticos se enganavam e perdiam os rodopios e o rock'n roll espiritual que dos primeiros exalava. Pessoas não possuem idade, fato importante que sempre era desprezado, cabendo aos juízes proporcionar as ações às aparentes rugas. Sinais apenas de que físico e alma não necessariamente estão em sintonia, para aqueles que veem. Deveriam saber o segredo simples: que almas velhas são leves e joviais, e a sobriedade é a preocupação de não deixar transparecer o erro de ter ganho as rugas sem o devido aprendizado.


domingo, maio 16, 2010

Sintonia e Ressaca

As energias guardadas são extravasadas de forma demasiado intensa. A pouca frequência em que isso ocorre gera problemas maiores, inimaginados.

O grito, canto, dança e os sorrisos são formas absurdas de causar um vício e uma fuga bem-vinda da realidade. No fundo, não são necessários para a vida, mas fazem parte do conjunto de portas que, uma vez abertas, nos obrigam à uma nova interpretação da forma de viver. Não existe coisa pior do que tirar uma locomotiva d'um trilho que chegará a algum lugar certo, justificando que outra estrada de ferro percorrerá as encostas de montanhas, vales belos e atingirá exatamente o mesmo objetivo.

Não é sobre questionar a veracidade de tal proposta, é apenas a observação que não pode haver sintonia entre tais possibilidades e aquele que as julga desimportantes. Não há ajuste possível que permita ressonar a estímulos que não permanecem tempo suficiente para serem vivenciados e desejados, aprendidos. Causam o efeito inverso, pedindo afastamento e um júri completo para correta interpretação, isenta das influências momentâneas. Burocraticamente, ficam poucas notas nos autos, e a certeza de que não deveria haver novo julgamento.


sábado, maio 15, 2010

Azedume

O amargor pode ser apreciado também, como o ácido com tanino ao enólogo treinado e falsamente ao pedante. Quem julga é culpado pela falta de bom senso ao crer na veracidade de informações ouvidas e má interpretadas, além de insistir irracionalmente por melhores oportunidades, ainda que as atuais ou futuras terão essas faculdades ou outras de mesma intensidade.

E o sonho é ter tal chance, de jardins cuidados, cerca branca, piscina e churrasqueira para juntar os inexistentes amigos. Afinal, projeções de ideiais atrapalham muito o andamento das coisas.

Ilusões de nova vivência recaem no velho prazer de um novo amargo, apaixonante como o Campari ou o Vinho, seduzido pela solidão de combinações pouco prováveis dessa extravagância. Decoração de bar, importante para o todo, ainda que não faça parte de qualquer classificação.

Ainda que sejam apresentados sabores e temperos, nada remove o amargor, uma guinada desejada aos valores já um tanto desgastados, padrões de comportamento de uma época em que não se vivia.

Os olhos ainda tentam piscar vagarosamente, para reverter o desprezo pelo tempo, fingindo uma importância de cada instante.

O relógio não anda.


terça-feira, maio 11, 2010

Uma Nova

Máscara, ou melhor, pele. Que cobrisse o corpo inteiro, para que a parte mais interna pudesse resistir às investidas do ambiente. Desejava.

Não só a face, mas o corpo todo, pois este age, sofre e não quer resistir. No fundo, prefere definhar e ser substituído, pois não é imprescindível que permaneça como é.

Algo precisa ser destruído para que possa ser novo.

Não há Fênix sem cinzas.


Pedra

O que na verdade incomodou foi o tamanho da pedra. Pois pausas são sempre necessárias para rever o conforto de nossas bases e raízes. Mas a pedra, ou rochedo, era grande demais. Mal cabia o pé já anestesiado e pouco incomodado com a divisão.
Competições à parte, às vezes é necessário andar descalço.


quinta-feira, maio 06, 2010

Answering your question

I didn't... in fact couldn't know her. I had this funny feeling, a blend of fear, anxiety and desire of living this whole new moment, but was stuck in my decision making process. I wondered if her skin would be specially soft in my touch, even knowing that I wasn't able to really face her.

Well..let me explain... when you're in the traffic jam you care solely about the sky, the trees and the last thing you had in mind that suddenly vanished. New things come into your sight and you're still trying to grab that last thought...

Summarising...It was an instinct need to taste whatever it appeared to be. A flavour, a different perfume. Something beyond presumable created images.

Regret? No, not exactly, this supposes I did something, though I was just 'myself'. Thus, regret won't happen instantly when you act as usual. When you keep drowning in your own lack of existence, you forget your inability to belong to any environment. This fact makes your desired actions look quite easy to be done. They start to run inside your head as a motion picture in a director's mind, being written, scene by scene, hoping for a surprising turning point while you're completely numb.

...

Her skin was soft, she held my attention and my breath. Then she had to tell me her unmarried status that we could go out for a party, yet to begin, all in one sentence. She faked an insobriety and didn't appear charming to me anymore. I entered my car and spread my eyes in a glance for the last time... I realised that I couldn't see the other girl right next to her in her completeness...

Got into my car, spread my eyes over her, last glance, engaged in first gear and left these thoughts behind. Again.



segunda-feira, abril 26, 2010

Respiro

Pela manhã percebeu que havia algo diferente. Um certo vazio no peito, contrastante com o aperto de angústia que o acompanhou por meses. O ar passava por suas vias respiratórias com dificuldade, arranhando objetivamente se o obrigasse a passar rápido, profundamente.

Haveria de respirar com calma, devagar. Cada instante de cada vez, sem marcos de novas atitudes, sem impulsos de vontade. Paz pela respiração? Somente por controle, não intensidade. Tentou sobrepor as barreiras recentemente encontradas, sendo presenteado com tosse forte o suficiente para ver estrelas, asmática, sufocante.

Não havia razão especial para esse achado, fato ou acontecimento. Por um momento estranho, seu ímpeto fora freado por questões físicas, reduzindo-o à própria e única possível limitação: ele próprio.


sexta-feira, abril 09, 2010

Pé Gelado

Afaste de mim esse pé gelado!
Há calor para apenas um.
Sim, par, por meus pés ocupado.
Não temos mais nada em comum.


segunda-feira, abril 05, 2010

Vestimenta / Imperícia

Do hábito, o monge. Apesar de a descrição de suas roupas, fora de contexto, soar vulgar, não estava e não era. Shorts curto, meiacalça preta, em tramas de losangos e uma camisa em tons claros de bege, com folhos adornados brancos. Se vestisse um chapéu, pareceria dançarina de cassino, mas nos poupou dessa pouco lisonjeira comparação.

O conjunto descontraído a fazia pertencer à festa. Como as máscaras que dão vida às personagens, as roupas dançavam o ritmo por si só e chamava atenção. E como! Embora a imperícia em espalhar o charme para o salão a fizesse apenas atrair os olhos de outrem para aqueles que bem perto estavam, provavelmente há tempos, numa órbita descendente.

O fato é: intrigava. Permanecia ao lado de um rapaz pouco apessoado, enquanto convencia outros a estarem perto, mas nem tanto. Afastava com a palma da mão na altura da cintura, num gesto secreto que impedia a execução de movimentos que seriam permitidos em outra ocasião. "Para! Não", e olhava para os lados para certificar que não fora vista. Era a dona dos ímpetos de tais rapazes, antes mesmo que soubessem o que queriam ou havia. Seria um esporte tal conquista, já que nenhum deles fazia seu tipo, sendo apenas passatempo pouco ponderado? Causas e consequências não eram preocupações.

A imperícia de lidar com as próprias conquistas satisfazia os espectadores. Mais precisamente, eu, que podia olhar sem censura alguma e não conter o riso com o olhar direto.


terça-feira, março 30, 2010

A preguiça do Segundo Sol

A vontade própria do Segundo Sol (SS) está bastante em baixa. Preguiça. Iluminar a vida alheia sem nunca ser observado de perto, nem por muito tempo, deprime qualquer pessoa. Não poderia ser diferente para o astro.

O nome sugeriria coadjuvação, embora isso possa não ser verdade. A intermitência e o tom de surpresa fazem do segundo sol, sempre, o espetáculo mais esperado. Ainda, possui maior mobilidade também, mas isso não é fácil de explicar ou citar.

Virou de costas há pouco. Entristecido com o que sua luz permitia ver, o que noutro momento de penumbra julgava serem assim mais belas, todas aquelas coisas. Longe dos detalhes, das características e do comportamento tão imprevisível, embora decepcionante.

Justo não é exigir sua volta, pois pouco se contribui para o bem-estar de tal. Mas, tampouco é possível consolá-lo em definitivo, visto que pouco se sabe a seu respeito. Até hoje não se conseguiu observar com clareza a superfície e suas irregularidades, sendo a imagem representativa oriunda apenas de algumas formas interpretadas de sua luz. Seria necessário fechar o olho por alguns momentos, na medida certa, mas convencê-lo a não virar de costas. Seria possível tocá-lo, assim, fisicamente? Não sei.

Talvez apenas precise dar uma volta pela noite, numa órbita diferente, apagado, a observar as formas por outra claridade. Separar as primeiras das últimas imagens. Somente assim seria capaz de ponderar o quanto de sua luz própria interfere no que é visto.


sábado, março 27, 2010

Parcialidade

Lembranças são parciais. O suficiente para nos odiarmos por ter acreditado, de olhos brilhantes, naquilo que corria em branco-e-preto, com rostos felizes, em nossa mente tão carecida.
Tudo estava escrito. O tom da trilha sonora dá a felicidade que já existiu e parece saudosa tão ausente.

Na realidade, tudo isso é bem tricky, posto que esquecemos de alguns detalhes cruciais... A mão que andava dada à outra, a primeira corajosa que ousou tocá-la, foi a mesma que segurou firme um aparelho para proferir os mais danosos absurdos. Irrecuperável, visto que a vida não é conservativa, e a defesa natural é se afastar, abstendo-se.

Reduzir-se à própria invalidez, com a certeza de focar em algo que não deveria ser tão prioritário, alimentar do pouco fruto de uma estiagem extensa e crer que isso era melhor para uma sociedade inteira.

É fato que os caminhos, por mais tortuosos, sempre levam os protagonistas ao final almejado. Mas esses outdoors enganosos estão atrapalhando demais...

Como parar de crer na imparcialidade dos decoradores de ruas? E dos diretores de peças de teatro ao ar livre. E dos takes em ambientes movimentados, repletos de afeto, amor e compaixão? Existe alguém capaz de dizer a todos eles que isso não existe?

Questiono isso e também na vendagem de tal arte abstrata. Com a distância e tempo prolongado de ausência dessas experiências, sendo tão difícil de enxergá-la no íntimos dos comuns, como interpretar as falas de um conosseur parcial? Não é tempo de ficção.


sexta-feira, março 26, 2010

quarta-feira, março 24, 2010

Casa

Na verdade eu procurava Francisca. Pela calçada tortuosa e movimentada durante o dia e deserta à noite.
Havia acabado o expediente, estava escuro, muito embora houvesse iluminação pública. As árvores criavam penumbras difíceis de encarar.
Uma senhora apoiava as mãos no parapeito de uma grande janela, com os braços abertos a observar nada. Talvez estivesse me esperando. Receptiva, perguntei sobre Francisca.
Me apontou, muito distante, "a lâmpada?", fez que sim. A única acesa na próxima quadra.

Resolvi chamá-la, assim, Casa de Francisca.

Era lugar que havia estado outrora, mas as pessoas não eram iguais, tampouco as conversas. As vozes dos instrumentos, que lá eram tocados, tinham uma nova estória. Estar lá, de novo, era diferente... Certamente havia deixado algo passar da última vez, como os ponteiros de um relógio que sempre caminham entre o fundo e o vidro, varrem o mesmo espaço, mas sempre registram coisas irrelevantes, que não representam fielmente os ocorridos, que não se repetirão mesmo, de forma alguma.

Menos de trinta segundos que lá estava, pedi um chá de hortelã e esqueci o que me levou até ali.
Registrei apenas que a chama da vela, na sua forma mais bruxuleante, golpeada por rajadas de todos os lados, aprendera rapidamente as leis de sobrevivência: adaptar-se.

Do resto, não me lembro.


quinta-feira, março 18, 2010

Mais doutor

- Sabe Doutor, no fundo é isso.
- No fundo?
- É, em resumo.
- Pois bem, digo de maneira sucinta: Você precisa mudar. Ou melhor, você vai mudar, de uma forma ou outra.
- Mas, não sei se estou pronto.
- Você não tem escolha, ninguém tem. Tem dois jeitos de se tratar o assunto: ficar lutando contra enquanto sofre ou aproveitar a fase de mudança.
- Como assim, não estou lutando contra...
- Tsc, tsc. Mente sem ficar vermelho, nem assustado. Que coisa. Vá para casa com a ideia de que você precisa curtir a vida, isso por si só já é a mudança.
- Mas...?
- Sua hora acabou, não esqueça de falar com a Sra. Gertrudes. Hoje você recebeu sua alta.

Atônito, com dificuldade de colocar um pé após o outro, em sentido de marcha, se dirigiu à saída e ao mundo que o cegava veementemente.


sábado, março 06, 2010

Um pouco mais sobre a chuva

A chuva é a tranquilidade que todos precisam. Internamente não somos um céu azul, com poucas nuvens e rostos felizes. Mas sim a intensidade da incerteza, a angústia das nunca respondidas perguntas e um desapontamento sereno e grave.

Entre marés de vento forte, a torrente agressiva banha tudo que não pode se esconder, vulnerável. O que é fraco demais deve ser levado e não sustentado pelos raios de sol que ainda alimentam o sofrente moribundo e o afasta do cortejo fúnebre. Pois que lave e leve logo. Chuva é a imagem-semelhança, a certeza de que existe um espelho maior, não controlável, que afirma firmemente que somos compreendidos.

Uma grande cortina que deixa todos reclusos, reflexivos e reforça aos mais fortes que sempre se deve esperar o momento certo. As sensações pela chuva. Pois, muito claro isso deve ser, que não é preciso sentir se for possível ver e vice-versa.


quinta-feira, março 04, 2010

Sobre Pessoas

As pessoas podem mudar, mas não querem e não o fazem.. Talvez só um pouco. Ficam abertas a isso por curto tempo e, depois disso, fingem muito bem. Até que os agentes de mudanças se tornam grandes estorvos. Mas nunca são devidamente culpados e, nisso, acabam sem poder se martirizar como deveriam. Um altruísmo incabível.

Levar os créditos sacia a necessidade de fazer história. É necessário contar aos outros que não se ficou fechado, que arriscou, perdeu, ganhou. Que deu a volta por cima.

Mas a falta de novas possibilidades de créditos os fazem voltar aos serviços não pagos. Seria consolo afirmar que nada disso era em prol das pessoas, mas sim do dever em si próprio, de fazê-las enxergar o que era necessário.

Estamos quites se pensarmos que o dever, do outro lado, é justamente surrar tais agentes. Escorraçar aqueles que agem conforme o impulso e a própria natureza. Enfim, todos agem conforme os impulsos, ainda que instintivos ou devidamente racionais.

Todos cumprem os devidos papéis e deveriam estar quites. Mas, claramente, isso não ocorre. A falta de comunicação permite que ambos os lados vistam lentes que mostram as cores que gostariam de ver. Essas interpretações alteram o real equilíbrio do que fora feito. Visões não são imparciais e sim poéticas. Não adianta alinhar discursos se as evidências mostrarem outra coisa.

Não é assim que acontece. Não como deveria acontecer. Nunca acontece. Não há vilão, mas se sente. Sempre há uma voz que ecoa outras verdades plausíveis, falta de confiança é a chave de tudo.

Atire uma pedra se for realmente importante, mas deverá sentir corretamente. A pedra no ar, girando, em câmera lenta, dói mais no agressor por saber a intensidade, do que no agredido, que ainda não sabe a razão de tudo aquilo.


quarta-feira, março 03, 2010

A volta

Era uma vez um nefelibata que pôde descer das nuvens. As razões não são necessárias para o causo, embora fossem para a história do indivíduo. Como jovens às descobertas, observava maravilhado os novos acontecimentos. Via os cinzas e meios-tons com atenção, para se certificar de que aquilo era real. Percebeu que deveria agir com moderação, visto que poderia ser inquirido a respeito de tentar "tocar" o ar e outras belas coisas que via.

Mas o período passou, as breves férias chegaram ao fim e era hora de voltar. No meio do caminho de volta, continuou a olhar para tudo o que tinha feito parte de seu cotidiano pelo tempo que quase o fez mudar por completo. Chegando às nuvens, deixou de ter traços corretos das vistas que já conhecia.

Sequer havia completado o percurso e ficava difícil de distinguir os traços do que via. Se o tempo todo esteve muito acima daquele ponto, sobre nuvens mais espessas, o que era capaz de enxergar e, enxergava? Haveria ponto exato de controlar os traços para mais suaves de tudo o que conheceu? Ou, ainda que tudo muito parecesse, provável seria pela habilidade de nossas faculdades mentais em criar o que precisamos, inconscientemente?

De qualquer forma ou sorte, nada existe mesmo. E isso independe de onde estamos.


segunda-feira, fevereiro 22, 2010

Ao telefone

Chutava folhas imaginárias. Era possível vê-la morder levemente a ponta dos dedos ao aproximá-los dos lábios ansiosos e sorridentes. Dava poucos passos e logo volta-e-meia. Sorria com os olhos também.
Estava ao telefone.

O mundo não existia. Uma horda de cavalheiros passava desajeitada, levantando poeira e jogando seus cabelos ao vento. Ficava mais bela, é verdade. Sã, intocada por qualquer coisa mundana, observava além do que se via: era mais.

Se houvesse janela, saberia que seria admirada pelos que passassem trôpegos na calçada do outro lado da rua. Esta era pouco irregular, mas a visão os desnorteariam. Engraçado seria observá-los em disfarce, ainda que desnecessariamente.

Estava próxima e distante. Apesar de a centímetros, o que havia estava somente entre o telefone e o outro protagonista. No íntimo dos envolvidos na cena, externamente, restava um certo ciúmes e algumas lembranças.

O que passa aos olhos é sempre um filme já visto, independente dos personagens. Há sempre um dom de curvar as novas situações ao que interessa no momento. Moldando os acontecimentos para encaixar o que pouco se pôde dizer na época, o que se tinha vergonha, mágoa e era tão irreal.